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ATÁVICO (Solideus)

maio 8, 2012

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Nos meses depressivos de junho, julho e agosto

quando deixamos as barbas empestearem os rostos

e deixamos a sombra da animalidade por fazer

as sobras pro prazer

Recusar sua sina guiando-se pelo cheiro

perder-se do rebanho.

Quem tem fome de viver?

 

Adivinhar o tom  das horas seguintes (o abandono do amanhã)

solitário como um deus

rico de humanidade pobre de utopias

Passar a vida a sujo

libertando a lira

e tocar um instrumento

quase arrancando uma confissão

a gritos de paixão, ódio, enternecimento

 

O trânsito caótico das paixões

a transitoriedade das coisas do ser

quando todos estão estáticos

como se faltassem pernas

o mergulho no mistério

a grandeza da dúvida

e a  predileção por cavernas,

roubando à lua as trevas

devorando os desencontros na vida

um mundo próprio, quase um outro planeta

Talvez uma herança ancestral

um eremita,  um canibal, um poeta

 

Na natureza tudo que perde se cria

( e o que cria se perde)

Tudo nos  transtorna

 

Ao invés de olhar para as tristes luzes da cidade

famosas por sua alegria e beleza

contemplar

as belas luzes do poente

ociosas, em sua calma e tristeza

viagem (só) de Vida

sem volta

(Ozias Stafuzza)

(foto José Luis Espada Feio)

 

PEQUENO IDÍLIO

maio 7, 2012

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Havia um tempo , dançava um folguedo

escrevia brincando no desejo mais chão

Pulava acordes , soltava rimas

a  palavra na ponta dos dedos

Rodava o pião em redondilhas

corria quadras , heróico, ligeiro

 

Subia nos galhos mais altos dos livros

escalava o verso perfeito

De pé quebrado , meu verso branco

brincando, a vida chegava sem jeito

Coisa de gente pequena

a palavra na ponta dos dedos

Bolas e notas, as noites mais belas

escolas de enxergar estrelas

 

Pílulas pra dormir

anticoncepcionais de poemas 

pra não abandoná-los à própria sorte

coisa de gente terrena

Garimpo em rios secos fios rasos

a palavra da cor do dilema

 

Havia um tempo de se escrever brincando

Ora não se brinca de viver

E o que a vida fala não se escreve

a palavra escapou  entre os medos

Quando escrevo não vivo

e viver não é brinquedo.

 

O SENSO COMUM

maio 7, 2012

O Senso Comum

é irmão gêmeo do mau gosto

e  o seu rosto é como o de qualquer um

Agride a tapas

com palavras caricatas, vazias

desconhece luvas de pelica, ironias

 

As coisas pequenas do mundo

só cabem no mundo das pequenas coisas

 

            Ah, quem dera a grandeza

            de estar

            sem ser

            Seja zen

            seja sem

 

Não a anestesia batizada de paz

não a hipocrisia tingida de  deus

ou o rótulo de ‘é tudo igual’

não a voracidade que atende por bom

(não a ganância que atende por ‘eu’)

nem rebeldia vestida de última estação

A assimilação doentia do mal

real cegueira do senso comumImage

ÀS PAREDES

janeiro 23, 2012

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CANTIGA N° 10 – Os Pares

janeiro 23, 2012
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Gélida
como mensagem de secretária eletrônica
Cálido
como campanário harmônico
E combinamos
(meus olhos insones, teus olhos insanos)
como café com funcionário público
como futebol e amante com matrimônio,
como Deus e o Demônio,
revista erótica com pelos púbicos,
psiquiatra com manicômio,
corrupção com erário público,
denúncia com represália,
o dólar e o falsário,
a beata e o rosário,
simpatia pra doentes,
antipatia pra chatos.
Solo em nosso idílio,
o exílio de teu solo assolado …
Antes amantes só
do que matrimoniados.

ADÉLIA À FLOR

janeiro 21, 2012

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Porque damos nomes às flores e sentimentos,
guardava os papeizinhos pra não me esquecer e afastar os perigos,
como um dia recolhias as cascas.
Só no teu reino de saltos e sobressaltos
manda a alegria dos doidos e de santos,religas a alma à poesia.

Expões nossos delírios feito pedras do rim,
veias, lírios, quem sabe camélias perfumadas ,
livros amarelados daquele sabor antigo:
Saudade , frases em espinhos trespassados de mel

Chego a pensar se passeias pelo mato
entre dálias , gerânios, azaléas.
Pudera beijar tuas sandálias e sair pelo mundo …
Viver de pouco debulhando as coisas e suas graças,
tirando as pedrinhas,
preparando os temperos ,disparado de pressentimento!
Mas, e depois, como ficar inteiro, à flor da pele de Adélia?
E ficar sem vontades
que não sejam as de fechar a concha, puxar a colcha
e ,sem sonho , se perder no escuro até virar pó?

(Porque damos nomes aos sentimentos das flores
resolvi fazer um poema pra ela,
pois mesmo sendo Adélia em sua origem nobre,
um pobre trovador pode decantá-la, pois, singela que é
não recusaria uma glosa)
Rosa do amor divino ,
que viva Divinópolis o mundo todo
pra eternizá-la em terço e prosa,
em verso e cordas
(que a vida roga uma obra dos céus como prova)!

ANTIGRAVITACIONAL

janeiro 18, 2012
Quando criança sonhava ser astronauta…
Então vivo nos mundos
da Lua,
de Vênus, de Marte,
da Via Láctea.
Qualquer parte, esfera,
que não a sua,
que não mais à sua
espera.

PÉS NA JACA

janeiro 17, 2012
                                                                               imagem: Debora Bertoncelo
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Um pé na boca, um pé na bunda ou um pé na cova:
arrisque!
ao invés de lágrimas e vida moribunda,
a mão na roda :
trovas, vida louca e doses de whisky..”

DE LIRA TREMENS

maio 16, 2011

Por cansaço e reentrâncias na rua
um conhaque convidou-me a entrar e sentar.
Por lacunas e algumas manchas de ferrugem
um gosto de anos pisados
temperou minha língua.
E pus-me a falar com sombras …
Por papéis em branco e quadro negro futuro
as cãs me alertaram
que eu devia me deter
nas folhas, nos versos,
no sonho, nas camas.
Porque não queria ficar nem ir, decidir,
dissuadi-me, dissolvi,
pus-me a ler e escrever,
bebendo palavras amargas,
buscando seqüestrar os sentidos,
palitando fiapos rangentes
de músicas, fibras, livros e liras
até a dor criar barriga,
o céu fazer bico e pagar a conta.

                                          glass of cognac-art by renata

for export

maio 10, 2011

O que parece alegria por vezes é desespero
o que é escolha, na verdade, merecimento,
o que se assemelha a conquista é desterro
Outras vezes se traveste de fé o desalento
e o último recurso é o primeiro